segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

Consumo de crack atinge mais de 3% e vira epidemia na cidade




Montenegro vive epidemia por uso de "Crack"

Adreane Becker



No Retiro Comunitário de Reabilitação Ocupacional, internos são submetidos a um trabalho de conscientização

A epidemia de crack que assola o Rio Grande do Sul se faz sentir também em Montenegro. Conforme uma pesquisa realizada pela Central Única das Favelas (Cufa), em 17 bairros da cidade, a droga que mata mais do que qualquer outra e afunda os dependentes na degradação moral e no crime tem 1.111 usuários. De acordo com o coordenador da Cufa em Montenegro, Rogério Santos, foram entrevistadas 820 pessoas entre setembro e outubro deste ano.

Na realização do levantamento, os moradores foram questionados sobre a existência de grupos de usuários de crack nas imediações de suas residências. "Não saímos perguntando para os indivíduos se usam crack. Fizemos um trabalho de investigação entre a população", conta Santos.

Até o dia 30 de setembro, havia 551 pacientes cadastrados no Centro de Atenção Psicossocial (Caps) de Montenegro. Desses, 226 são usuários de drogas, 105 são dependentes do álcool e 220 sofrem de transtornos mentais. Segundo a coordenadora do Caps, psicóloga Jaqueline Porto, a maioria absoluta dos usuários de drogas é viciada em crack. "O secretário estadual da Saúde, Osmar Terra, já declarou que existe uma epidemia de crack no Estado", enfatiza Jaqueline.

Santos explica que, quando o percentual de usuários de crack ultrapassa 3% da população, caracteriza então uma epidemia. E a pesquisa em Montengro revela que, nos bairros Aeroclube, Ferroviário, Centenário, Industrial, Germano Henke, Panorama, Tanac e Municipal, os viciados na droga são mais de 3% dos moradores. A situação mais grave ocorre no Industrial, onde o índice é de 9,61%.

O Câncer da criminalidade montenegrina
A situação no município é tão grave, que o comandante da 1ª Companhia do Batalhão de Polícia Militar (BPM), capitão Oscar Bessi Filho, afirma que o crack é "o Câncer da criminalidade em Montenegro". Segundo ele, arrombamentos, furtos simples e qualificados, assaltos a pedestres e comércio ilegal de produtos diversos são praticados por dependentes dessa poderosa droga. "O usuário se entrega à delinqüência. A Brigada Militar tem extremo interesse em combater o uso dessa droga", alerta. O capitão exemplifica o absurdo da situação no município ao citar o caso de um homem que recentemente foi pego tentando trocar roupas de bebê por pedras de crack.

Para tentar amenizar a situação, a Cufa trabalha com inclusão social na periferia e atua em Montenegro desde o último dia 7 de setembro. Rogério Santos explica que a organização tem o dever de inteirar-se sobre os principais problemas da comunidade, e foi assim que se constatou ser o consumo do crack um grande mal no município. A entidade procurou o secretário municipal de Saúde e Ação Social, Romeu Kirch, que indicou o Caps como o serviço de saúde apropriado para que se realizasse um trabalho conjunto.

Assim, a Cufa juntou-se ao Caps, por meio de sua coordenadora, a psicóloga Jaqueline Porto. A organização popular e o serviço de saúde estão trabalhando na deflagração de uma campanha de combate ao uso do crack. Para isso, realizam reuniões periódicas com integrantes do Conselho Tutelar, da Brigada Militar, do Grupo Vida Feliz e agentes de saúde. "Queremos agregar mais entidades à nossa luta, como o Poder Judiciário e o empresariado", diz Santos. "Precisamos realizar um trabalho em rede", reitera Jaqueline.

Ainda, ela acredita no aumento do número de moradores de rua, já que muitos usuários da droga são rejeitados pelas famílias. Eles então procuram o Caps não apenas em busca de tratamento, mas de um lugar para dormir, de alimentação e da reconciliação. Santos diz que a campanha a ser deflagrada não deverá espalhar o pavor entre a população, mas conscientizar as pessoas, num trabalho a longo prazo.

90% dos internos do Recreo são usuários
Raros no começo desta década, os usuários de crack são hoje a maioria dos internados no Retiro Comunitário de Reabilitação Ocupacional (Recreo). Dos cerca de 100 internos, 90% são usuários da droga. Os 10% restantes são viciados em álcool, cocaína e tranqüilizantes. O orientador David Ferreira Santos Filho conta que a idade dos usuários de crack varia entre 14 e 45 anos e que eles pertencem a todas as classes sociais – "do mais pobre ao mais rico".

De acordo com David, eles chegam à entidade desidratados, extremamente magros e ansiosos, já que fazem uso diário do crack. Ele constatou que pessoas que usavam cocaína injetável passaram para o crack, que é mais satisfatório e proporciona um prazer mais imediato. Conforme o orientador do Recreo, não é possível usar o crack sem se viciar.

A recuperação é difícil. Quem procura o Retiro é submetido a um trabalho de conscientização e realiza o tratamento durante nove meses. "Não podemos dizer que, após esse período, os dependentes estão curados, mas eles saem daqui com uma concepção diferente da vida", diz David. A partir do sexto mês de internação, eles passam períodos em suas residências. No sétimo, permanecem por 10 dias em casa e, no oitavo, 15 dias. O tratamento se encerra no nono mês, mas os dependentes fazem acompanhamento em grupos como os Alcoólicos Anônimos (AA).

David conta que há pessoas internadas por ordem judicial, cujas famílias estão completamente desestruturadas. Nesses casos, os dependentes são atendidos por médicos, que receitam medicamentos juntamente com o tratamento terapêutico oferecido pelo Recreo. "É o processo de ressocialização que cura", diz o orientador, contando que muitos dos usuários de crack perdem o emprego e vendem tudo o que possuem, até os móveis e a comida que têm em casa.

Assaltos a ônibus para sustentar o vício
João* tem 20 anos e está internado no Recreo há cinco meses. Ele decidiu pela internação porque deseja se recuperar e percebeu que sozinho não conseguiria. Aos 17 anos, o jovem começou a usar maconha misturada com crack, o "pitico". Em seguida, passou a fumar somente crack. Ele trabalhava como garçom em uma pizzaria, mas perdeu o emprego por causa da droga. Então, moveu uma ação judicial contra o empregador a fim de conseguir dinheiro para se drogar. Dos R$ 3.000,00 que recebeu como indenização, gastou R$ 2.000,00 com o crack.

"Não há dinheiro que chegue", conta João, revelando que chegou a assaltar ônibus para sustentar o vício. Ele praticou cerca de dez assaltos a coletivos, sempre junto com um grupo de amigos. Conta que não usavam armas, sendo os assaltos praticados só "no caô". Num dia em que não participou do assalto, aconteceu de seus amigos serem presos pela polícia. Ele ficou apavorado com a prisão dos comparsas e decidiu parar de assaltar e deixar de conviver com essas companhias.

Nessa época, ele já havia trocado o dia pela noite, estava muito magro e dormia muito pouco. "Eu estava virado num zumbi", compara. O interno revela que não suportava mais viver daquela forma, e que por isso os primeiros dias no Recreo não foram tão difíceis. "Eu quero muito me livrar do crack. Desde que estou aqui não tive vontade de usar a droga, mas tenho medo de sair daqui e voltar a usar", desabafa João. No próximo dia 24 de dezembro, ele sairá do Retiro e fará visita de uma semana à sua família.
*Nome fictício

O barato que sai caro
O crack é uma droga relativamente barata, mas que se torna cara pelo tamanho do mal que causa. Com R$ 5,00, compra-se uma pedra, que satisfaz o usuário por cerca de 15 minutos. Ao prazer intenso e efêmero, segue-se a urgência da repetição: em seguida ele quer usar novamente, chegando a gastar R$ 300,00 numa noite.

Apreensões de crack aumentaram 165%
De janeiro a agosto deste ano, as apreensões de crack em Montenegro aumentaram 165% em relação aos primeiros oito meses de 2007. Foram apreendidos 287 gramas da droga (575 pedras). Segundo as autoridades policiais, as ondas de assalto e furto em estabelecimentos comerciais e residências têm relação direta com a droga.

A delinqüência tornou-se indissociável do vício, e o impacto sobre a violência é avassalador. Não há dependente de crack sem relatos de brutalidade e morte de amigos. Conforme o delegado regional de Polícia, Ciríaco da Costa Caetano Filho, não resta dúvida de que a maioria dos pequenos delitos, como furtos, são praticados por usuários de crack ávidos por comprar algumas pedras da droga.

Droga chega ao cérebro em segundos
O crack é feito com o que sobra do refinamento da merla (que é o resto do refinamento da cocaína), misturada a bicarbonato de sódio. Para serem consumidas, as pedras são colocadas num cachimbo improvisado e queimadas, emitindo pequenos estalos – daí o nome "crack".

A droga provoca efeito semelhante e é tão potente quanto a cocaína injetada. Ao ser fumado, o crack atinge os pulmões e entra na corrente sangüínea instantaneamente, chegando ao cérebro em poucos segundos. Então bloqueia a absorção natural da dopamina, o neurotransmissor que dispara no cérebro a sensação de prazer. Com excesso da substância entre os neurônios, surge uma sensação imensa de euforia e onipotência. Quando o efeito passa, vem a Depressão.

Cufa presente em 27 estados brasileiros
A Central Única das Favelas (Cufa) é uma organização nacional formada a partir de reuniões entre jovens de várias favelas do Rio de Janeiro, que buscavam espaço na cidade para expressar suas atitudes e questionamentos. Em 1998, eles fundaram a Cufa. A metodologia da organização é baseada no conceito de Fair Trade (trabalho em rede). Hoje, em 27 estados, existem unidades da Cufa, totalizando cerca de 80 bases de trabalho nas periferias do Brasil. No Rio Grande do Sul, a organização foi fundada em novembro de 2005. Em Montenegro, a Cufa iniciou seus trabalhos no dia 7 de setembro deste ano, e possui projetos nas áreas de esporte e cultura.




Pesquisa realizada pela Cufa/Montenegro entre os meses setembro e outubro/2008
BAIRRO Nº DE USUÁRIOS HABITANTES PERCENTUAL
Aeroclube 120 1395 8,60%
Santa Rita 70 3142 2,22%
São Paulo 50 3356 1,48%
Progresso 35 1512 2,31%
Ferroviário 145 2719 5,33%
São João 20 2208 0,90%
Centenário 90 1644 5,47%
Industrial 170 1768 9,61%
G. Henke 80 1530 5,22%
Bela Vista 65 2638 2,46%
Centro 50 5240 0,95%
Panorama 56 1098 5,10%
Tanac 25 364 6,86%
S. Antônio 40 3114 1,28%
Timbaúva 20 2786 0,71%
Municipal 30 915 3,27%
Rui Barbosa 45 2858 1,57%
Obs.: Essa pesquisa não tem base científica.

3 comentários:

carba disse...

Ola! gostei muito no que houvi e li sobre a Cufa sou policial do batalhaão ambiental a 3 anos antes trabalhava no policiamento policial a 23 anos e trabalho no combate as droga e violencia desde de 2002 onde fiz o curso de instrutor do PROERD formei mais de 1500 crianças de como ficar longe das drogas e da violencia e na lições jaz falava sobre o crack droga essa ainda muito distante da nossa realidade e hoje uma epidemia sinto vontade de me somar a uma legião de pessoas preocupadas no combate as drogas mas na minha cidade o apoio e muito pouco e o consumo de drogas "o Crack" cada vez aumentando mais. Quem sabe o envolvimento dos poderes publico como esta acontecendo em Montenegro fosse o ponto de partida para se começar em conjunto combate e ajuda a esses que ja estão envolvidos no mundo das drogas. desde ja agradeço.

Monaliza disse...

Olá!
Eu sou a Monaliza, trabalho como professora no REcreio, comunidade para os adolescentes do Recreo. Creio que nos conhecemos e sabemos de nosso envolviemnto com o trabalho! á luta!!

ana disse...

ola gostei muito das informaçoes tenho um sobrinho com eses problhemas e estou tentando ajudalo