sexta-feira, 13 de agosto de 2010

A FAVELA E A PERIFERIA TEM VOZ




Por Celso Athayde – Fundador e secretário geral da CUFA

Estamos num momento de extrema importância para a trajetória política brasileira. É chegada a hora de definirmos novamente os representantes de nossa nação, em espaços como o Palácio do Planalto, o Senado Federal, os Governos dos Estados e as Assembléias Federais e Estaduais. São muitos os candidatos e candidatas que estão numa corrida desenfreada para continuar no poder, para assumir pela primeira vez.
Nesse contexto, fico a imaginar o que essas pessoas têm de propostas concretas para a comunidade da favela. Afinal, quem mora nesses locais, também faz parte da população brasileira que tem certas invasões midiáticas, apenas por um viés mais destrutivo e estigmatizado do que pela construção positiva do que se tem de bom, cultural e social, nesses cantos externos ao asfalto.
Nota-se, portanto, que nossa imprensa, seja ela falada ou escrita, mesmo com algumas aberturas, segue e prevalece o mesmo script: expõe as cenas de arruaça pública e apresenta, quando se apresenta, apenas duas únicas versões para as tragédias que circundam o cotidiano de nossas comunidades. Uma das versões, não menos importante, é a da polícia, alegando que o povo da favela tem ligação com o tráfico, dando a entender que em caso de mortes, essas mortes são resultantes de confrontos diretos e que, portanto, ocorrem em legítima defesa. Claro, tudo em nome da legítima sociedade oficial.
A outra versão, pouco menos divulgada, é a do povo que mora nesses bolsões de pobreza. Esse sempre afirma que há em nossos cantos, trabalhadores e estudantes, muitos deles nada tem com o tráfico, muitos não, quase todos. . Constrói-se, assim, uma imagem cínica que vai embotando a capacidade de discernimento da situação, tanto na cidade como nos territórios.
E ai, o que fazer? Eu não sei, as vezes nem quero mais avançar com os trabalhos da CUFA, pois apensar dos avanços é sempre deprimente o resultado geral , do coletivo nacional. O que fazemos impacta , mas o que vemos , nos deprime. Mas ao menos devemos saber o que queremos, que é mudar essa realidade. Para isso, propomos a criação de uma via de mão-dupla na construção de novas políticas públicas para a favela.
Queremos que a favela conte os seus desejos, suas lutas diárias e que, juntamente com os governantes, sim, com eles sim, possam influenciar diretamente na proposição da sociedade justa, solidária, igualitária e constantemente sonhada. Puta merda, essas frases jargão é igual a lixo, no geral pode jogar fora , mas se fuçar pode ter algo que se possa aproveitar . Mas no fundo é o que desejamos mesmo.
De qualquer forma, não é possível deixar de considerar que as condições de vida das populações miseráveis do mundo, vão continuar sendo a base dos discursos direcionados para grandes projetos governamentais e em eventos multilaterais, constitui sem dúvida uma conquista dos vários segmentos da sociedade civil que, de meros receptores das benesses do Estado, se transmutaram em sujeitos políticos.
Colocada a questão nesta perspectiva, vemos o crescimento das favelas nas redes de relações que resultam destas novas mobilizações. Em outras palavras, passamos agora, para o reconhecimento de que a atuação de determinadas ONG´s oriundas do próprio contexto de povo e que resulta em novas demandas geradas, e as relações com o poder público vem respondendo em termos de formulação e implementação de políticas sociais.
E fiquem espertos , pois, existe uma tendência da mídia e da sociedade que não vai aceitar que alguns setores sociais se movimentem. Eles acreditam que as organizações da parte baixa da pirâmide social devem ficar lutando somente para colocar telefone comunitário na favela, e que as ONGs do asfalto devem sim, continuar falando em nosso nome, reproduzindo a velha e conhecida pratica.
Por fim, neste recente resgate da temática dos direitos humanos, articulado ao processo de democratização, parece apontar para o esgotamento da metáfora da guerra e indicar novos caminhos para a construção da favela que queremos. Na verdade nem queremos favelas, eu e a CUFA pelo menos não queremos, assim como não queremos PAC e favelas bairros. Queremos sim, um grande equilíbrio social de forma que esses espaços de degradação humana, simplesmente desapareçam. Mas já que elas estão ai, então a luta é para humanizá-las.
Por isso é importante, muito importante, que os candidatos a todos os cargos eletivos vejam as favelas de outras maneiras e para isso a favela precisa se organizar, propor e cobrar propostas e claro, exigir o cumprimento dos compromissos assumidos.
Achamos por exemplo que é importante a ida dos presidenciáveis na FIESP, programas de TV, e em tantas outras frentes políticas. Mas e na favela ? por isso que nós estamos fazendo esse ano mais uma rodada de debates com os presidenciáveis , entre eles Dilma , Marina e serra . O Objetivo não é apenas receber uma visita, mas fazê-los ver que estamos nos organizando, que temos opinião e não precisamos de intermediários.
Esse ano vamos ainda ter uma novidade. Ao recebê-los vamos transmitir as propostas ao vivo, pois o nosso objetivo não são as melhorias na Cidade de Deus, a final favela é igual em toda parte, ainda que alguns prefiram chamar de palafitas, vilas, morros, assentamento ou comunidade. O fato é que a política que vale para a CDD vale para todo o Brasil.
Por fim, vamos abrir a partir de segunda-feira, no site da CUFA, um espaço para que as favelas do Brasil possam se manifestar e parte desse sentimento passaremos as mãos dos candidatos e parte ficará no site da instituição. Não podemos garantir que o nosso futuro presidente (a) vai cumprir suas palavras , mas podemos garantir que só seremos respeitados enquanto cidadãos se tivermos voz , e temos , só precisamos ser ouvidos .